Monte Santo, no coração do sertão baiano, vive nestes dias o auge da sua Romaria de Todos os Santos, uma das maiores expressões de fé popular da Bahia. Segundo registros e observações de órgãos religiosos, a cidade aparece como a segunda mais movimentada do Estado, atrás apenas de Bom Jesus da Lapa, e o que antes era apontado por pesquisas agora se comprova a olhos vistos.
Desde a quinta-feira, 30, e com ainda mais intensidade na manhã desta sexta, 31, o município se enche de romeiros vindos de toda a região e de vários estados do Nordeste. A fé, o cumprimento de promessas e a emoção de reviver tradições se misturam em cada passo da subida ao monte — mesmo sob o sol forte e o calor do sertão, os fiéis somem pelas ladeiras de pedra em direção ao alto, onde as 25 capelas representam a Via-Sacra de Cristo.

Os que chegam cedo o fazem movidos pela devoção e o silêncio da fé, e percorrem o trajeto da serra ainda nas primeiras horas do dia. Já os que chegam entre as 18h e 21h, vindos para participar também da parte festiva, das apresentações culturais, do comércio e do reencontro com amigos, não deixam de manter a tradição das três voltas em torno da Igreja Matriz de Senhor dos Passos.
O significado das três voltas
A tradição de dar três voltas em torno da Igreja remonta ao século XVIII e carrega um profundo valor espiritual. Cada volta representa um gesto de fé: A primeira, de agradecimento pela graça alcançada; A segunda, de pedido de perdão e purificação da alma. A terceira, de súplica por proteção e bênção para o retorno ao lar.

O costume teria surgido ainda no tempo do frei Apolônio de Todi, missionário italiano que, ao chegar à região por volta de 1780, construiu o conjunto de capelas na serra por ver nela uma semelhança com o Calvário de Jerusalém. Desde então, a Igreja de Nossa Senhora da Conceição, erguida no sopé da serra, se tornou o ponto final da peregrinação — o local onde o romeiro encerra sua promessa, dá as três voltas e agradece em oração.
Fé, turismo e identidade sertaneja
Monte Santo não é apenas um destino de fé: é também um espetáculo de religiosidade, cultura e hospitalidade. As ruas ficam tomadas por barracas, cantorias, procissões e celebrações que unem o sagrado e o profano num mesmo espírito de devoção popular.

A romaria movimenta o comércio, lota pousadas e fortalece o turismo religioso, consolidando o município como um dos principais polos de peregrinação do Nordeste.
Um palco de história, arte, política e fé
Monte Santo também já foi palco de grandes momentos da cultura e da política brasileira. Em 1962, o cineasta Anselmo Duarte escolheu a cidade para gravar cenas do clássico filme “O Pagador de Promessas”, vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes e único filme brasileiro a conquistar esse prêmio até hoje. As ladeiras de pedra e o cenário do santuário deram autenticidade e beleza às cenas que retratavam a força da fé popular.

Além disso, o município recebeu visitas ilustres ao longo das décadas. Entre elas, destaca-se a do saudoso Luiz Gonzaga, o Rei do Baião, que esteve em Monte Santo no final da década de 1950, quando participou de uma celebração religiosa e encantou os moradores com sua simpatia e devoção. Gonzaga, profundamente ligado à religiosidade nordestina, chegou a declarar em entrevistas que Monte Santo era um dos lugares “onde a fé do sertanejo se mostrava mais viva”.

E em tempos mais recentes, Monte Santo voltou a ser cenário de destaque nacional. Durante a campanha eleitoral de 2022, o então candidato à Presidência da República, Ciro Gomes (PDT), escolheu a Serra de Monte Santo para gravar um de seus programas de televisão, reconhecendo o simbolismo e a força espiritual do lugar.

Ainda naquele mesmo período, o governador Jerônimo Rodrigues, recém-eleito, também fez questão de visitar o município, onde subiu o monte e agradeceu pela vitória nas urnas, em um gesto de fé e gratidão que marcou sua primeira visita pública após o resultado das eleições. A imagem do governador na serra, rezando e cumprimentando moradores, repercutiu fortemente em toda a Bahia.

Antes disso, em 2009, o ex-governador Paulo Souto, do União Brasil, também esteve em Monte Santo para cumprir uma promessa e fazer seus pedidos espirituais, quando se preparava para disputar a eleição de 2010. Sua visita reforçou a tradição do local como ponto de encontro entre fé e política, mostrando que, independentemente de partidos, a energia da serra inspira respeito e devoção em quem a visita.
Essas passagens de artistas, líderes políticos e personalidades reforçam que Monte Santo é mais do que um destino religioso — é um símbolo da cultura, da fé e da identidade sertaneja, um espaço onde o sagrado, o humano e o histórico se encontram em perfeita harmonia.
Monte Santo não é apenas visitado — é vivido. E quem sobe o monte, uma vez, leva pra sempre o peso e a leveza da fé sertaneja.
 
	    	 
    	




